A História da Arte e
as Representações do Feminino - Parte I.
Richard Burlet - 1957 - Rêve.
A arte está ligada a vida, respira a imaginação exalando o
belo. Então como não representar esta figura tão onipresente que é a mulher.
Este mês a mulher é festejada, lembramos suas lutas,
conquistas e o caminho que ainda resta a percorrer. O que temos a comemorar? As
opiniões se dividem como em qualquer tema de peso. Quanto a mim procurei
desvendar o feminino que permeia a arte desde os primórdios, dar-lhe voz, pois
o que é a arte sem a retratação do belo? E o que é o belo sem o feminino?
Sim,
porque somos, todas nós mulheres, belas em nossas diferenças, nos papéis que
nos cabem, em nossas andanças diárias, em nossa maternidade. Temos todas as
idades e idade nenhuma, nossa beleza ora se oculta ora se desvenda por inteiro
nunca deixando de nos permear. Aqui, nossas muitas faces retratadas através da
arte tantas vezes captadas pelo também sensível olhar masculino, a quem minha
homenagem se estende, pois o mundo é isto – duas forças - Yin e Yang - que se
completam e que sozinhas brilham menos, porém juntas são capazes de iluminar
tudo.
Sandra Biermann - Yin and Yang .
A figura da mulher na arte vai se desvendando como uma imagem da qual
fazem parte singularidades diversas.
No
imaginário artístico as mulheres sempre foram um tema constante: mulheres
honoráveis e mulheres infames nas sociedades egípcias e greco-romanas; “Evas” e “Marias” na
iconografia religiosa e cristã; mulheres em ocupações cotidianas a partir do
século XIII; mulheres simples e outras nobres;
A mulher ora simbolizada como
santa, ora como musa sedutora e a diversidade de suas representações oferecem
um painel significativo dos papéis simbólicos que ela representa ao longo dos
tempos tal como ela se revela a cada novo período histórico. As imagens dizem
muito, nos produzem, nos significam, nos sonham.
Cléopâtre essayant des poisons sur des condamnés à mort,
1887 Huile sur toile - Alexandre Cabanel.
Élisabeth Vigée –
Lebrun – self portrait – 1790.
La Liberté guidant le peuple - Delacroix - 1830.
Bartolome Esteban Murillo - Inmaculada - Museo del
Prado.
Gustav Klimt Judith and the Head of Holofernes - 1901.
Pré-História:
A mulher aparecia retratada em estatuetas de pedras,
ossos, madeiras e marfim com sentido místico e mágico. As Vênus são memória de
um período onde a preservação da espécie estava colocada sob a responsabilidade da mulher, ressaltando as características da fertilidade da mesma, simbolizando
a figura materna.
Venus von Willendorf, Naturhistorisches Museum
Wien - Escultura do período Paleolítico Superior (~ 15.000 a.C)
Trata-se de uma pequena estátua (11.1 cm de altura) encontrada nas proximidades de Willendorf na Áustria, em 1908. Visivelmente retrata uma mulher prestes a dar a luz. Posteriormente, o pequeno objeto, submetido às perícias do carbono 14, um quase exato método científico que apura a idade dos achados, revelou que aquela senhora esculpida com as primitivas ferramentas de um Cellini do Paleolítico Superior datava de 24 ou 25.000 anos atrás. Não havia nela nem um só traço de beleza. Nenhuma exaltação à feminilidade ou à graça da mulher. Aquele que a modelou, talvez um xamã, um sacerdote-artista, viu-a apenas na sua função mais natural, a mais primitiva da mulher: a de gerar filhos.
Arte Antiga
Egito
Espírito de Heuroben, prostrando-se diante do Deus
Crocodilo, Sebek - Papiro da XXI Disnastia - Museu do Cairo.
Afresco em Tebas – Adoração.
Uma das principais civilizações da Antigüidade foi a que se
desenvolveu no Egito. Tratava-se de uma civilização já bastante complexa em sua
organização social e riquíssima em suas realizações culturais.
A religião invadiu toda a vida egípcia, interpretando o universo, justificando sua organização social e política, determinando o papel de cada classe social e, conseqüentemente, orientando toda a produção artística desse povo.
Além de crer em deuses que poderiam interferir na história humana, os egípcios acreditavam também numa vida após a morte e achavam que essa vida era mais importante do que a que viviam no presente.
O fundamento ideológico da arte egípcia é a glorificação dos deuses e do rei morto divinizado, para o qual se erguiam templos funerários e túmulos grandiosos.
A religião invadiu toda a vida egípcia, interpretando o universo, justificando sua organização social e política, determinando o papel de cada classe social e, conseqüentemente, orientando toda a produção artística desse povo.
Além de crer em deuses que poderiam interferir na história humana, os egípcios acreditavam também numa vida após a morte e achavam que essa vida era mais importante do que a que viviam no presente.
O fundamento ideológico da arte egípcia é a glorificação dos deuses e do rei morto divinizado, para o qual se erguiam templos funerários e túmulos grandiosos.
Afresco em Tebas – Adoração.
A arte Egípcia surgiu há mais de 3.000 anos a.C., mas é entre 1.560 e 1.309 a.C. que a pintura Egípcia se destaca em procurar refletir os movimentos dos corpos e apresentar preocupação com a delicadeza das formas.
Os egípcios não trabalhavam com a técnica da perspectiva
(imagens tridimensionais). A Lei da Frontalidade, ou frontalismo, é uma das
convenções mais intrigantes da arte do antigo Egito. Essa convenção vem a
refletir a maneira peculiar pela qual os egípcios antigos faziam suas
representações, mais especificamente, a reprodução da figura humana. O rosto,
as pernas e os pés são retratados de perfil enquanto que, simultaneamente, o
tronco é visto de frente.
Mulheres tocando flauta, alaúde e harpa – Tumba de
Nakht – Egito.
Numa primeira análise, julgou-se que esta forma de expressão estaria ligada à
incapacidade ou ingenuidade do desenhista. De acordo com estudos posteriores,
no entanto, chegou-se à conclusão de que existiriam outras razões para este fenômeno.
A maneira como os egípcios representavam
o ser humano na pintura valorizava o aspecto mais característico de cada
elemento do corpo humano. Desenhado de perfil o rosto humano é realçado, porque
de frente resume-se a uma figura oval. Representavam o olho como que visto de
frente inserido no rosto pintado de perfil, por este ser seu aspecto mais
característico e revelador. Para muitos povos antigos os olhos eram a "janela da
alma" e eram valorizados ao máximo nas representações pictóricas.
Alto relevo - figura Rainha Cleopatra - Egito Antigo.
Juventude, corpo esbelto, traços finos e alongados e a simetria como componentes necessários eram o ideal de beleza dos antigos egípcios. Esse padrão é muito bem demonstrado no rosto da Rainha Nefertiti (literalmente "a bela chegou"), que viveu há 3.400 anos. O rosto dela personifica a beleza, o poder e o divino.
Busto de Nefertite - Acredita-se que tenha sido feito em
1345 a.C, pelo escultor Tutmés.
Havia dois adjetivos que eram usados pelos egípcios para descreverem coisas belas, ou pessoas bonitas, estes compostos por "N” e “NFR”, normalmente são escritos como Nefer em obras egiptológicas modernas mais comuns. Então, deduz-se que o nome dado a rainha se deve a sua beleza. Na verdade, o busto real de Nefertiti, esposa de Akhenaton (fundador do Período de Amarna) era, e é considerado, um exemplo clássico da beleza feminina.
An Egyptian Fellah Woman with her Baby, by
Elisabeth Jerichau Baumann.
Mesopotâmia
Os povos mesopotâmicos são as civilizações que se
desenvolveram na área das terras férteis localizadas entre os rios Tigre e
Eufrates. Entre eles estão os sumérios, os assírios e os babilônios.
A arte da Mesopotâmia se apresentava em sua
quase totalidade de cunho religioso. A religião, a magia e sua prática
fixavam-se na vida cotidiana com força de lei: qualquer transgressão às normas
acarretaria o castigo divino.
As estátuas mais características são figuras em forma de
homem ou de mulher em pé, chamadas de oradores, trajados com túnicas amplas, com
as mãos postas na altura do peito, sendo o rosto a parte mais chamativa do
conjunto, devido ao super dimensionamento dos olhos, normalmente elaborados com
incrustações de pedra. A arte Mesopotâmica considerava os olhos a janela da
alma.
A dama de Warka - III milênio a.C - Museu do Iraque - Bagdá.
Ishtar -
Babilônia 1800 - 1750 a.C.
Ishtar, na babilônia, deusa que representa a força da vida e
da luz foi reverenciada como deusa da sexualidade e da fecundidade.
Deusa Serpente (aproximadamente V milênio a.C.).
Deusa com cabeça de cobra amamentando o seu filho. Seu
triângulo pubiano demarcado denota sua função como regeneradora. Pertence a
cultura mesopotâmica de Ur, é de terracota e mede 14 centímetros de altura.
Estátuas oradoras
do Templo de Abu, c. 2700-2500 a.C. (III milénio a.C.) - Tell Asmar,
Iraque - Calcário, alabastro e gesso.
Persas:
No Irã atual, as mulheres são obrigadas a vestir-se
modestamente, mantendo os cabelos cobertos e usando roupas compridas e largas
para ocultar a forma do corpo, porém isto não foi sempre assim, na antiga Pérsia,
tanto homens quanto mulheres se adornavam com requinte e elegância.
Persian
Woman gathering around a Samovar – 19 century.
As informações que nos chegam sobre a
mulher na antiga Pérsia provinham de
autores gregos como Heródoto, porém os fatos se distorcem pelo próprio conceito
que os gregos tinham em relação à mulher.
Lendo essas fontes temos a impressão
de podermos vislumbrar a mulher persa envolta em véus, misteriosa, oculta, praticamente sequestrada e relegada a um papel
secundário na sociedade. Porém, após a descoberta dos Manuscritos de Persépolis
(Persepolis Fortification Tablets), datados de 509-494 a.C., em 1933, pela
expedição arqueológica do Oriental
Institute da universidade de Chicago, a cargo de Ernst Herzfeld, esta visão
muda um pouco de figura.
Os manuscritos retratam uma sociedade patriarcal onde
as posições dominantes no governo, no comércio, no exército e na familia são
ocupados pelos homens, embora a posição destinada a mulher na sociedade persa não era tão insignificante e esta
parecia, segundo os manuscritos, ser tratada com respeito.
Na arte aparecem
retratadas abundantemente exceto em templos e edifícios públicos, geralmente
cobertas por véus que em sua sociedade lhes conferia dignidade e honra. Às
prostitutas e mulheres humildes era proibído usar véus por não terem a posição
social adequada.
Relíquia do Império Aquemênida (atual Irã) - datado
do IV século a.C.
Esta bela taça
foi feita a partir de uma única folha de ouro e foi talhada para retratar as
faces de duas mulheres que contemplam direções opostas. Adornam suas cabeças,
guirlandas em forma de serpentes atadas.
Pintura do palácio Hasht Behesht, da Era
Safávida (séc. XVIII).
Usando formas e materiais tradicionais, Reza Abbasi
(1565–1635), um dos mais famosos pintores e miniaturistas da escola Isaphan, introduziu
novos temas na pintura persa - mulheres semi-nuas, jovens e amantes. Sua
pintura e estilo caligráfico influenciaram artistas iranianos em grande parte
do período Safávida.
Celtas:
Nas tribos celtas, as mulheres ocupavam posições tidas como
essencialmente masculinas por civilizações vizinhas, como a grega e romana. O
fato delas lutarem como guerreiras não anulava a beleza e menos ainda sua feminilidade.
Ser guerreira era algo nobre, mas não impedia que
esta mesma mulher fosse também sensual ou mãe, pelo contrário, a força e a
delicadeza aliadas eram exatamente o seu diferencial, eram as características
que faziam dela uma pessoa segura, intrépida e apaixonante. Várias
facetas, muitas vezes contrastantes, coabitam o mesmo espírito de uma
mulher celta.
Boudicca - A rainha Vermelha - Estátua Bronze - Thomas Thornycroft - 1905.
A história
de Boudicca, rainha da tribo Iceni, comprova isso. Com a morte de seu marido, o
rei Prasutagus, Boudicca passa a chefiar sua tribo que não estava disposta a
ceder ao domínio romano. Um conceito marcante e recorrente na cultura celta é a
relação intrínseca entre a soberania da Terra, representada pela rainha de um
povo. Quando os soldados romanos humilharam Boudicca e suas filhas, não era
somente a honra delas que estava sendo duramente ferida, mas a honra de cada
Iceni. Agredir física ou moralmente uma rainha era o mesmo que manchar a
soberania da Terra. A história de Boudicca nos faz perceber que o que
alimentava a coragem e a ousadia da mulher celta eram justamente o respeito e a
confiança que o povo tinha na figura feminina.
Boadicea Haranguing the Britons – John Opie.
China:
A arte chinesa é significativa não apenas por sua beleza, mas
também porque foi a maior fonte de inspiração para todo o Oriente. Na
antiguidade, a pintura de retratos e a pintura histórica eram os principais
gêneros, uma vez que a pintura estava subordinada a uma função bem precisa, a
saber, a de educar nas virtudes através da visão.
A pintura chinesa tem como
característica marcante o uso do traço como forma de expressão, indo de
encontro à pintura ocidental, que joga com o claro e o escuro e camadas
sobrepostas de cores. A base da pintura é constituída pelos "quatro tesouros do
estúdio": o pincel, a tinta, o papel e os tinteiros. Na pintura chinesa,
a melodia delicada e o sentimento que os pintores querem expressar podem ser
bem apresentados através de pinceladas simples, o que se deve ao uso hábil do
pincel, experiência de milhares de anos.
Damen beim Tritrakspiel - Damas jogando - Dinastia Tang - séc. VIII - Nanquim e tinta sobre seda.
A serenidade dos rostos femininos, a sensualidade
ainda velada, os tradicionais trajes étnicos envolvendo delicadas figuras
femininas, ora se ocultando atrás de leques ora cobrindo-se com graciosos
guarda-sóis, pois a brancura da pele era muito valorizada na antiga China. Olhares
inocentes quase que infantis geralmente não encaram o espectador, pois as mulheres
chinesas são culturalmente discretas, silenciosas. Na China a mulher é
retratada tal qual uma melodia, uma sucessão coerente de sons e silêncios,
inserida em belíssimas paisagens que forma em seu conjunto uma sinfonia ímpar.
Sueño de las mansiones Rojas - Feng Xiaojiang.
Gu Xuefang
- Beautiful Lady.
Winter boat lost in lotus waters - Wang Meifang
- Zhao Guojing.
Zhao Guojing & Wang Meifang – character from
the novel “ The Red Room”.
Ladies with parasols - Zhao Guojing & Wang
Meifang.
Fayries song - Zhao Guojing & Wang Meifang.
"Que nada nos defina. Que nada nos sujeite. Que a liberdade
seja a nossa própria substância.”
―Simone de Beauvoir
Adorei... Que essas belíssimas imagens e dizeres, digam muito sobre nós... Que elas nos produzam, nos signifiquem... E como dizia Simone da Beauvoir: Que nada nos defina nos sujeite e assim sendo, que a liberdade seja a nossa própria substância !!!
ResponderExcluirMajestosas representações no mundo artístico se utilizam de nossa beleza e singeleza como fonte de inspiração, nos deixando apenas uma conclusão, como bem cita Schopenhauer "A mulher é um efeito deslumbrante da natureza".
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